Fincantieri: DAN visitou os estaleiros militares e a mais nova FREMM italiana

O Defesa Aérea & Naval visitou os estaleiros de Riva Trigoso e Muggiano e ainda foi a bordo da mais nova Fragata FREMM da Marinha Italiana.

Fragata FREMM Antonio Marceglia (F 597) em fase final no estaleiro Muggiano

Por Guilherme Wiltgen

Na esteira do atual programa da Marinha do Brasil (MB), para a construção de quatro Corvetas da Classe Tamandaré (CCT), o Defesa Aérea & Naval (DAN) foi conhecer onde a gigante europeia Fincantieri, constrói os modernos navios de guerra para a Marina Militare Italiana (MMI) e outras diversas nações que empregam seus navios ao redor do mundo.

A Fincantieri está participando do programa CCT com o consórcio FLV, formado ainda pela Leonardo e o estaleiro Vard Promar.



Uma relação antiga com a Marinha do Brasil

A história entre a Fincantieri e a MB se iniciou em 1910, quando foram ordenados à Cantieri Navale Fiat San Giorgio, localizada em La Spezia, os três primeiros submersíveis brasileiros da Classe F (Foca), pelo estão Ministro da Marinha, o Alte. Julio César de Noronha, surgindo assim a Força de Submarinos.

Em 18 de janeiro de 1913, a MB também encomendou um Navio Tênder ao Cantieri Navale Fiat San Giorgio. O Ceará teve sua quilha batida em 15 de julho de 1913, foi lançado ao mar em 7 de setembro de 1915 e incorporado a Armada em 28 de abril de 1917.

Navio Tender Ceará construído pela Fincantieri para apoio aos submarinos da Marinha do Brasil

Em 10 de março de 1937, a MB firmou novo contrato com o estaleiro italiano e adquiriu os submarinos Neghelli, Gondar e Ascianghi, da Classe Perla da Marinha Italiana. Os submarinos foram batizados de Tupy (T 1/S 11), Tymbira (T 2/S 12) e Tamoyo (T 3/S 13), respectivamente.

Corredor principal dos escritório em Muggiano com a foto do submarino Tamoyo em testes de mar

Ao entrarmos no corredor que dava acesso a sala do Engº Luca Maggiolo, Diretor Geral do estaleiro Muggiano, e a sala de reuniões onde fomos recepcionados, nos deparamos com esta foto do S. Tamoyo, feita durante seus testes de mar ao largo de La Spezia. Estávamos em um lugar histórico, o berço dos submarinos da Marinha do Brasil.

Riva Trigoso

Vista aérea do estaleiro Riva Trigoso

O primeiro estaleiro visitado foi o de Riva Trigoso, em Gênova, onde são construídos os navios de guerra. Há 30 anos trabalhando na Fincantieri, o Engenheiro Naval Stelio Vaccarezza, que se divide entre Unidade de Negócios Navais em Gênova e a Presidência da Fincantieri do Brasil, acompanhou o DAN durante a visita, que iniciou com a apresentação das capacidades do estaleiro pelos engenheiros Roberto Alessandrini, Chefe do Departamento Mecânica, Eugênio e Gabriele e pela Sra. Micaela Longo, do Departamento de Comunicação e relacionamento com a imprensa, da Matriz em Trieste.

Placas alusivas aos navios lançados ao mar pelo estaleiro de Riva Trigoso

       

O estaleiro em Riva Trigoso é um dos maiores e mais antigos estaleiros italianos, foi fundado em 1° de Agosto de 1897 em Riva Trigoso, que é uma fração da cidade de Sestri Levante, na província de Gênova.

Área interna de chaparia do estaleiro em Riva Trigoso

       

       

Uma parte do casco de um PPA em construção

Dos seus 22.000m² de área de produção, o estaleiro já construiu muitos navios de guerra para MMI e outras Marinhas, entre eles estão o porta-aviões Cavour, os Destróieres classe Andrea Doria, Fragatas Classe Lupo e Maestrale,  Classe Bergamini (a versão italiana da FREEM), o Navio de Apoio Logístico Vulcano e em breve, o mais moderno OPV da Marinha Italiana, o PPA (Pattugliatore Polivalente d’Altura), entre muitos outros.

BAP Quiñones (FM 58) da Classe Lupo

Enquanto visitávamos a área de construção, nos levaram para ver de perto três navios de guerra que estão atualmente sendo construídos em Riva Trigoso. Um deles é a segunda unidade do novíssimo PPA, que se encontra em estado avançado de construção.

Os outros dois são a nona e a décima unidades da FREMM (versão de Emprego Geral), Spartaco Schergat (F 598) e a Emilio Bianchi (F 599), previstas para serem lançadas em março de 2019 e 2020, respectivamente. Devido as restrições da Marinha Italiana, não foi possível fotografar os navios.

       

Sua estrutura industrial ainda possui um guindaste com capacidade para içar estruturas de até 240 toneladas e uma Shipway Plataform de 174 x 60m, por onde os navios são transportados, individualmente, para diques flutuantes para serem lançados ao mar.

       

Para tudo isso funcionar, a estrutura de funcionários é composta pelo Sr Luca Maggiolo, Diretor Geral (que fica no estaleiro Muggiano), 24 gerentes, 380 Engenheiros/Técnicos/Administrativos, 534 Operários. O Departamento Mecânico é o que demanda a maior parte da mão de obra, respondendo por 306 funcionários.

Em Riva Trigoso são produzidos os hélices, os eixos, os estabilizadores (retráteis e não retráteis), os sistemas de posicionamento, Cargo/Handling e sistema de geração de energia.

Pegando por exemplo a planta dos hélices, praticamente todo o processo de fabricação é feito no próprio estaleiro, sendo que a Fincantieri possui uma gama de hélices que inclui Controllable Pitch Propellers (CPP), Featherable Controllable Pitch Propellers (FCPP) e Fixed Pitch Propellers (FPP).

A Fincantieri fabrica todos os hélices de seus navios. Na foto hélices de passo variável.

A Fincantieri Marine Systems tem longa experiência no design e produção de hélices de passo variável, que vão desde os mega iates, passando pelos mais tradicionais navios comerciais até os modernos navios de guerra, combinando eficiência de propulsão em todas as condições de funcionamento, comportamento de cavitação, emissões sonoras e vibrações, visando satisfazer todas as restrições dos projetos, avaliando as características particulares para cada tipo de casco.

Os diâmetros dos hélices variam conforme os tipos de navios, no caso dos modelos militares, um OPV vai de 2 a 3m para 4.500Kw (Max Power Shaft), uma Corveta de 3 a 4m para 6.500Kw, uma Fragata/Destróier de 4 a 5m para 22.000Kw e um porta-aviões de 5 a 6,5m para 44.000Kw.

       

Os editores do DAN acompanharam a fabricação de um hélice do futuro PPA, mas devido ao sigilo industrial, não foi possível registrar sua fabricação. Outra característica dos hélices da Fincantieri é que as lâminas são todas idênticas, nos explicou o Eng° Vaccarezza. Ou seja, caso seja necessário realizar a troca de uma danificada, durante um deployment por exemplo, a lâmina é substituída por outra sem necessidade de se ter que fazer o balanceamento. Gerando economia de tempo, de recursos e da quantidade de lâminas transportadas a bordo.

Essa tecnologia FCPP, utilizando as lâminas idênticas, também será aplicada ao projeto da Corveta Tamandaré proposta pelo consórcio FLV.

Em outro ponto referente ao programa CCT, o Eng° Vaccarezza nos explicou que o estaleiro Vard Promar não irá produzir algumas partes e peças para os quatro navios, como os hélices e seus eixos, face a escala de produção, e por essa razão, a fabricação se dará em Riva Trigoso, sem taxa de importação.

Outra preocupação do estaleiro é com o controle de poluição. Nada é jogado no mar, tudo é tratado. Isso se reflete na sua vizinhança, cujas praias são públicas e muito frequentadas durante a alta temporada do verão europeu.

Somente com a construção dessas duas classes, o estaleiro tem mais 20 anos de trabalho garantido, levando-se em conta apenas as encomendas do Governo para a Marinha Italiana. Existem ainda as encomendas internacionais, assim a empresa (e o País) mantém a mão de obra qualificada e todo o conhecimento em construção naval militar, parte importante da indústria naval para qualquer país. A manutenção desses programas também reflete diretamente na economia local.

Muggiano e a visita a FREMM

Fincantieri em Muggiano

Finalizando nossa visita à Fincantieri, chegamos ao estaleiro Muggiano, localizado em La Spezia, onde fomos recebidos pelo Diretor dos dois estaleiros, o Engº Luca Magiolo. Fundado em 1883, o estaleiro atua em sinergia com o de Riva Trigoso, realizando principalmente as atividades de complementar, preparar, integrar os sistemas e armamentos e realizar os testes de mar dos navios, além de construir submarinos e mega iates.

Nesta imagem pode ser visto à esquerda, o novo passadiço do LSS Vulcano em estado adiantado de construção

Durante a nossa visita, foi possível ver um submarino U-212A, da Classe Todaro da Marinha Italiana, que se encontra dentro de um hangar em período de manutenção geral.

Fragata FREMM Alpino (F 594), navegando ao lado de um submarino U212A classe Todaro

Também foi possível ver o impressionante Navio de Apoio Logístico (da sigla em inglês  LSS – Logistics Support Ship) Vulcano (A 5335), que se encontra em reparos, devido ao incêndio ocorrido em 22 de julho. o LSS Vulcano foi construído em sua maior parte em Riva Trigoso, somente alguns blocos no estaleiro de Castellammari di Stabia, em Nápoles.

Fragata FREMM, Antonio Marceglia (F 597)

Um dos pontos altos foi  a visita a oitava unidade da Fragata FREMM, Antonio Marceglia (F 597), da versão de Emprego Geral, que se encontra em fase final de integração,  para iniciar seus testes de mar. Assim como as anteriores, a F 597 foi construída em Riva Trigoso e transferida para Muggiano para ser finalizada e entregue à Marina Militare Italiana.

As impressões sobre o navio foram muito boas e o projeto privilegia a qualidade de vida dos tripulantes, com áreas habitáveis confortáveis, graças ao conhecimento adquirido pela Fincantieri na construção de navios de cruzeiro, essencial para um navio que pode permanecer operando no mar por 45 dias.

       

A FREMM possui um amplo convoo equipado com uma grelha metálica,  para o uso de arpão ou pode ser instalado o sistema RAST (Recovery Assist, Secure and Traverse), podendo operar com aeronaves até o porte do AW101 Merlin. Tanto o convoo quanto os aparelhos de auxílio às operações aéreas são compatíveis com o uso de óculos de visão noturna (OVN/NVG).

Diferente da versão francesa, o hangar é duplo, o que possibilita o navio operar com dois helicópteros, podendo ser dois NH90 ou AW101 ou alternar com um NH-90 e um AW101. Em uma crescente nas modernas marinhas, futuramente poderá combinar com uma aeronave remotamente pilotada. O hangar de boreste tem capacidade de realizar manutenção na aeronave embarcada.

Também fomos a área onde serão instalados os dois lançadores triplos de torpedos Leonardo (WASS) B-515/3 para o modelo MU 90, bem como o seu paiol.

Passadiço

       

Finalizamos a visita conhecendo o Centro de Operação de Combate (COC) e o amplo passadiço da Fragata, de onde foi possível observar o canhão de proa de 127mm, Oto Melara 127/64, e o VLS Sylver A50 da MBDA, com 16 células para os mísseis Aster 15 e 30.

Canhão de 127mm, Oto Melara 127/64 e o lançador de VLS Sylver A50 da MBDA

A Fincantieri

A Fincantieri projeta e constrói navios mercantes, navios de passageiros, navios offshore e navios militares. O estaleiro italiano também atua nos setores de conversão e reparo naval.

Hoje a Fincantieri é um dos maiores grupos de construção naval da Europa e o maior no Mediterrâneo. Emprega cerca de 10.000 pessoas trabalhando em oito estaleiros, dois centros de projeto, um centro de pesquisa e dois locais de produção de componentes mecânicos. No ano passado faturou US $ 4,5 bilhões.

Os estaleiros de Monfalcone (Gorizia), Marghera (Veneza), Sestri Ponente (Gênova), Ancona, Castellammare di Stabia (Nápoles) e Palermo, se reportam à Unidade de Negócios dos Navios Mercantes, enquanto que os estaleiros de Riva Trigoso (Gênova) e Muggiano (La Spezia) para a Unidade de Negócio Naval, sediada em Gênova.

Em 2009, a Fincantieri adquiriu o Manitowoc Company, formado por dois estaleiros em Wisconsin, nos EUA, incluindo o Marinette Marine, que construiu o primeiro Littoral Combat Ship (LCS) da classe Freedom para a US Navy.

Littoral Combat Ship (LCS), fabricado pela Fincantieri nos EUA

A Fincantieri também adquiriu o Manitowoc Marine Group, que é um estaleiro voltado para serviços de reparos, em Ohio, e uma fábrica em Wisconsin.

Com essas aquisições, a gigante italiana se tornou também um dos principais construtores de navios de médio porte nos Estados Unidos, tendo como dois importantes clientes a US Navy e a US Coast Guard (USCG).

Brasil

No Brasil, a Fincantieri é proprietária do estaleiro Vard Promar, localizado no Complexo Industrial Portuário de Suape, em Pernambuco, onde ocupa uma ampla área na Ilha de Tatuoca.

Aliado a experiência e a solidez do grupo italiano, o fato do consórcio FLV possuir um estaleiro próprio, o coloca em uma posição de destaque na concorrência para construir quatro unidades da Corveta Classe Tamandaré, prevista para ser anunciada pela Marinha do Brasil em Março de 2019.

O estaleiro possui uma localização estratégica no estado, contando com a infraestrutura do porto e a proximidade do complexo aos centros tecnológicos, o que também confere pontos positivos a seu favor.

O estaleiro possui uma área total de 800 mil/m²,  sendo que a área industrial ocupa 250 mil/m², possuindo ainda um área coberta de 100 mil/m². A linha de edificação é de 300 x 80 m cada, com pórticos de 300 ton de capacidade.

O cais de acabamento de 300 m de comprimento, possui 8 m de calado. Além disso, o Vard ainda tem um dique flutuante com as dimensões de 150 x 40 m.

Da esq para dir: Guilherme Wiltgen, Engº Stelio Vaccarezza e Luiz Padilha

NOTA do EDITOR: O Defesa Aérea & Naval agradece ao Sr. Stelio Vaccarezza, pela total atenção dispensada, não poupando esforços para a realização desta matéria. Agradecemos também aos demais colaboradores da Fincantieri de Riva Trigoso e Muggiano, pela gentileza e presteza em atender a todos os nossos questionamentos e as mais diversas solicitações.



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