Piloto brasileiro de Super Lynx voa no Wildcat

CC Motta

O Capitão-de-Corveta (AvN) José Cláudio Netto Motta Júnior, do 1° Esquadrão de Helicópteros de Esclarecimento e Ataque (HA-1), atualmente realizando o intercâmbio com o Esquadrão 702 da Royal Navy, sediado na RNAS Yeovilton, foi convidado pela AgustaWestland para realizar um voo no AW159 e, em uma entrevista exclusiva ao Defesa Aérea & Naval, ele nos conta um pouco desta experiência:

Defesa Aérea & Naval: Comte. Motta, em poucas palavras, nos relate como foi a sua experiência em pilotar o AW 159 Lynx Wildcat?

Capitão-de-Corveta (AvN) José Cláudio Netto Motta Júnior: Pilotos de SH-3 Sea King da MB sonhavam com Seahawk, pilotos de UH-14 Super Puma sonhavam com o EC725 Super Cougar, pilotos de A-4 sonham com um “Sea Gripen” (talvez o Hornet ou o Rafale), pilotos de caça da FAB sonham com o F-X2 (qualquer um que seja), e assim por diante. Já os pilotos de Lynx sonham em continuar voando o LYNX! O Wildcat é a resposta aos nossos sonhos! E a herança, o legado de voar um dos helicópteros mais fantásticos do mundo, na sua “versão” mais moderna.

DAN: Muito se fala sobre desempenho do AW159, qual a sua opinião sobre a aeronave?

CC Motta: É uma aeronave fantástica para o emprego naval, o legado do Lynx de ser “o melhor helicóptero do mundo para navios com convoos pequenos” foi mantido pelo Wildcat. Quando os primeiros Lynx (SAH-11) chegaram na MB, os exercícios e os “jogos de guerra”, literalmente pendiam para o lado da Força Naval que tinha um helicóptero a”qualquer tempo” embarcado. Novamente, vimos isso acontecer por ocasião do recebimento do Super Lynx (AH-11A), com os novos radares de cobertura de 360°, ESM (MAGE) e agora com FLIR, é um desequilíbrio de forças.

Sabe-se que nenhuma fragata brasileira se faz ao mar sem um Super Lynx, nenhum comandante de navio ou comandante de Força-Tarefa abre mão do “poder” de um Super Lynx, a compilação do quadro tático é extremamente facilitada com um LYNX embarcado. Não tive a oportunidade de voar o Wildcat taticamente, mas pelos briefings dos quais participei na RN, sei que o mesmo é um salto ainda maior do que os Lynx foram para a nossa MB. Ele é um salto enorme, mesmo para a própria Royal Navy, que opera o Lynx Mk8, uma versão mais moderna que a brasileira. Com certeza o AW 159 desequilibra um cenário naval em favor da Força que o opere. Eu arriscaria até dizer que o Wildcat é capaz de criar um fator “medo”, semelhante ao que um helicóptero Apache cria nos blindados inimigos.

DAN: Qual a principal diferença entre o nosso Super Lynx e o Wildcat, em termos de sobrevivência em um cenário de confronto naval, tomando como exemplo de que ambos são orgânicos em um Escolta classe Niterói?

CC Motta: Quem “vê” primeiro, atira primeiro! (A não ser que vc queira correr o risco de responder num tribunal internacional.)
Como eu disse acima, nenhum comandante de FT abre mão da vantagem tática proporcionada pelo Lynx.
Repetindo, segundo os briefings com o Wildcat, essa vantagem é multiplicada inúmeras vezes, graças aos sensores no estado da arte. A gama de informações que a tripulação do Wildcat tem disponível, e que podem ser passadas de maneira segura para um comandante de navio ou FT, é muito maior e mais confiável. Se os Lynx eram os olhos e os ouvidos da Esquadra, o Wildcat será ainda a “visão além do alcance”.

CC Motta pronto para o voo no AW159

DAN: Com relação ao novo motor CTS800-4N e ao novo estabilizador, quais foram as suas impressões quanto a potência e a estabilidade da aeronave e as suas implicações nas operações a bordo?

CC Motta: O Lynx foi projeto pelos britânicos e para os britânicos. Recentes conflitos, em teatros de operações diferentes do Reino Unido, dos quais os britânicos têm participado (Golfo e Afeganistão), que são semelhantes aos de muitas regiões do Brasil, provaram que a reserva de potência do Lynx fica comprometida. Os novos motores CTS800-4N foram projetados para resolver esse problema e fazem seu papel com folga, e mesmo sendo o Wildcat uma aeronave mais pesada, com os motores sendo mais potentes, operam com boa margem dos seus limites. Bom, pelo menos até onde eu tive o prazer de testar.
Com relação à estabilidade, não foi percebida diferença, e é de acreditar-se que as operações a bordo serão muito mais seguras.

DAN: Os nossos Super Lynx são de uma geração bem anterior, possuindo todos os instrumentos analógicos. O AW159 possui Glass Cockpit, com telas em display que apresentam todos os parâmetros. Durante o voo, conseguiu perceber a redução da carga de trabalho proporcionada por esta evolução e quais as dificuldades que sentiu para se adaptar ao novo painel?

CC Motta: Digamos que isso é um paradoxo, pois com os novos sensores e o painel digital há um aumento na quantidade de informações disponíveis para a tripulação, no entanto, ela se apresenta de uma maneira muito mais “prática” e objetiva. É possível selecionar os displays para apresentar um “moving map”, no qual a tripulação pode literalmente “ver” onde a aeronave está, os parâmetros dos motores são priorizados se estiverem prestes a atingir/exceder algum limite, entre outros. Então, é possível perceber uma redução da carga de trabalho, ajudando a tripulação a manter atenção situacional tática elevada.
Houve, pessoalmente, uma pequena dificuldade de adaptação, simplesmente porque você está acostumado a obter certa informação olhando para uma direção, mas é normal, ocorrendo o mesmo quando voei o Esquilo na DHFS (Defence Helicopter Flying School) e quando dirigi pela primeira vez o carro com o volante do “lado errado” (mão inglesa), mas nada que em poucas horas você não se acostume.

DAN: O Lynx é reconhecidamente uma aeronave de ataque altamente manobrável, muitas vezes considerada como “arisca” por quem a pilota. Com relação ao Wildcat, esta característica dos felinos se manteve e qual a sua impressão quanto ao desempenho e reserva de potência adquirida pela adoção da CTS800-4N?

CC Motta: “Arisco”? Eu acho que ele é assim considerado por quem não o pilota, para mim ele é muito dócil. Mas, vamos à parte técnica. Um helicóptero muito estável no voo pairado é mais lento nas respostas aos comandos, é uma solução de compromisso. Helicópteros mais estáveis têm uma distância maior entre a fuselagem e a cabeça do rotor principal, do que helicópteros mais ágeis, como também, uma pequena distância entre o centro da cabeça do rotor e o início da pá. No projeto do Lynx, os britânicos chegaram num “ponto ótimo” entre essas duas situações, um helicóptero de respostas extremamente rápidas aos comandos do piloto, mas ao mesmo tempo estável como plataforma de lançamento de armas. Isso acontece graças à cabeça do rotor e as pás, peculiares ao projeto.

Se observarmos um Lynx, percebemos que o rotor principal “quase encosta” na fuselagem (não há o que se chama de mastro), bem como a grande distância entre o centro da cabeça e início da pá (chamado de punho). Essa característica dos helicópteros é denominada excentricidade. Já as pás tipo BERP (British Experimental Rotor Program) do Lynx são os ques lhe permitem atingir grandes velocidades para um helicóptero, retardando assim o stall de compressibilidade.
Se olharmos para o Wildcat, veremos que isso não mudou, ou seja, “não se mexe num time que está ganhando”. O Wildcat manteve a mesma característica de “arisco”… para quem não está acostumado!

Com relação aos motores, vou fazer uma analogia: “Se o Lynx é o carro esporte dos helicópteros, O Wildcat é um Fórmula 1”! Para evitar qualquer mau entendimento sobre esta analogia, esclareço que a maior potência dos motores não serve para “o prazer do piloto”, mas sim para operar a aeronave com margem de segurança em ambientes hostis e com temperatura elevada e baixa pressão, transportando ainda uma carga útil considerável, seja ela de armamento (missões de combate ASW ou ASuW), de transporte de um destacamento do GERR (Grupo Especial de Retomada e Resgate) em missões de operações especiais ou executando uma missão SAR.

Decolagem do ZZ398 do Army Air Corp (AAC) com o Aviador Naval a bordo.

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