Comandante da Aeronáutica fala sobre o processo de Reestruturação da FAB e os principais objetivos alcançados
Pensada há alguns anos, a Reestruturação da Força Aérea Brasileira ganhou impulso quando o Tenente-Brigadeiro Nivaldo Luiz Rossato assumiu o Comando da Aeronáutica, em janeiro de 2015. Desde então, a instituição está passando por uma reorganização administrativa e operacional, que visa à melhoria contínua dos processos e ao aumento da efetividade dos recursos disponíveis para a Força.
Ao completar mil dias à frente da Instituição, o Comandante avalia como a implementação de projetos estratégicos como o Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações Estratégicas (SGDC), o Gripen NG e o KC-390 vai contribuir para aprimorar nossas capacidades operacionais, garantir a soberania do espaço aéreo brasileiro e integrar nosso território, de acordo com a Estratégia Nacional de Defesa. Além disso, nesta entrevista, o Tenente-Brigadeiro Rossato fala sobre as perspectivas de Comando para o próximo ano. “Nossa expectativa é continuar o processo de renovação e consolidar novos conceitos”, afirma o Comandante.
O senhor completa mil dias de Comando no mês de outubro com grande parte deles dedicados à Reestruturação da Força. É possível fazer uma avaliação dos principais objetivos alcançados até agora com esse processo?
A Reestruturação da Força Aérea, diferente do que muitas pessoas pensam, não é algo recente. Ela já vem sendo pensada há alguns anos e, após muito estudo, começou a ser colocada em prática no ano passado. Entre os principais objetivos dessas mudanças, que buscam garantir a perenidade e a evolução da FAB, estão a reorganização administrativa e operacional da Força e a concentração das atividades administrativas. Buscamos a melhoria contínua dos processos e o aumento da efetividade dos recursos disponibilizados para a Força, sejam humanos ou materiais.
Com isso, visamos ao aumento da eficiência em função da concentração de mão de obra qualificada, cultura organizacional, padronização de procedimentos, economia nas aquisições e contratações de serviços, além do pleno atendimento das expectativas das organizações apoiadas e a desoneração dessas organizações para que foquem em sua atividade principal.
Minha avaliação, portanto, é de que os objetivos, gradativamente, serão alcançados e as adaptações terão continuidade, já que o processo de Reestruturação é algo dinâmico e estamos buscando correções ao longo de sua implantação.
Como o senhor avalia o reaparelhamento da FAB, como a aquisição do Gripen NG e do KC-390, além da modernização de outras aeronaves, aliado ao processo de Reestruturação?
Estamos falando em tecnologia. A tecnologia é justamente um dos principais aspectos que viabilizam a Reestruturação, pelo uso de sistemas e Tecnologia da Informação (TI) em larga escala. A operação destes novos e complexos sistemas de armas exige uma Força com amplo domínio dos processos, mais leve na estrutura, mais focada na atividade-fim, mais profissionalizada nas áreas específicas, sejam administrativas ou operacionais. Caso não consigamos esta evolução, pouco poderemos extrair destes modernos equipamentos. Os novos sistemas de armas que estamos implantando são mais eficientes e estão de acordo com a nova Estratégia Nacional de Defesa (END). Neste diapasão, a reestruturação leva em conta a distribuição de nossas Unidades no território de forma otimizada.
O avanço das tecnologias no setor aéreo e, consequentemente, os ganhos operacionais que obtivemos e continuamos obtendo com a aquisição de novos vetores, nos permite trabalhar de maneira diferenciada a questão territorial. A velocidade e a autonomia das aeronaves que passaremos a ter reduzirão nossas limitações e poderemos conseguir alcançar satisfatoriamente o que se espera de uma Força Aérea – como a defesa do espaço aéreo, as missões humanitárias ou de resgate – ainda que o esquadrão acionado esteja distante geograficamente.
No caso das aeronaves citadas, o KC-390 será a espinha dorsal da nossa Aviação de Transporte. Da Amazônia à Antártida, a frota terá um papel fundamental para os mais diversos projetos do Estado brasileiro, da pesquisa científica à manutenção da soberania. Essa aquisição, aliada à do Gripen NG, aprimora nossas capacidades operacionais e fortalece os alicerces necessários para a garantia da soberania do espaço aéreo brasileiro.
Não podemos jamais esquecer a razão da necessidade de termos uma estrutura organizacional moderna e eficiente, equipamentos e sistemas de armas com alta tecnologia, capazes de cumprir uma variada gama de missões e pessoal com alta capacitação. Nosso País é gigantesco, com riquezas quase infinitas, áreas de baixa densidade populacional, grandes florestas e água em abundância. Este conjunto desperta a cobiça internacional e não podemos ser ingênuos e acreditar que somente a diplomacia ou organismos internacionais farão o papel que nos cabe, ou seja, proteger nosso patrimônio. O poder aéreo é o principal meio de dissuasão, garantidor de nosso patrimônio, guardião de nossa soberania. Devemos estar sempre preparados, ocupar nossos espaços, instalar a infraestrutura e integrar plenamente nosso País.
O lançamento do Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações Estratégicas (SGDC), este ano, voltou as atenções do País e do mundo para a inserção do Brasil na era espacial. O senhor poderia avaliar a participação da FAB no programa espacial brasileiro?
Dentro da Estratégia Nacional de Defesa (END), a área espacial é atribuição da Força Aérea. Devemos integrar as atividades espaciais, pois o monitoramento e o uso do espaço são condições indispensáveis para o cumprimento das tarefas da Marinha, do Exército e da Força Aérea. As possibilidades oferecidas pelo uso de satélites óticos, radar, de comunicações e de geoposicionamento nos permitem um aumento significativo da consciência situacional de todo nosso território, como as áreas de fronteiras e as áreas marítimas. Permite-nos, também, o uso dual como no controle ambiental, planejamento da malha rodoviária, planejamento urbano das grandes cidades e uso intensivo na agricultura, entre outras oportunidades.
Pelas responsabilidades que a END nos atribuiu, e avaliando quantitativamente os resultados que o Brasil alcançou até hoje na área espacial, foi elaborado um estudo envolvendo o Ministério da Defesa e o Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações (MCTIC) e apresentada a proposta de um novo modelo de governança desta importante área para a soberania de nosso País. A partir desta nova estrutura, esperamos que seja possível dar um novo impulso na área espacial, definindo necessidades, custos e prazos para nosso programa espacial.
Quanto ao SGDC, citado na pergunta, trata-se de um satélite de órbita geoestacionária, exclusivamente brasileiro. Foi fabricado e lançado pelos franceses e está localizado sobre o Brasil a 36.000 km de distância. O SGDC está pronto para ampliar significativamente a capacidade de comunicações militares (o D do SGDC) que utilizam 25% da capacidade do satélite. Os outros 75% do satélite (o C do SGDC) futuramente serão utilizados por todos os brasileiros através da denominada “banda larga”, principalmente em regiões remotas, desassistidas pelas empresas que exploram este tipo de serviço de comunicação.
O Comando da Aeronáutica também se destaca pelo expressivo aumento do número de transporte de órgãos. Embora essa não seja uma das atividades-fim da Força Aérea Brasileira, como o senhor vê a utilização das aeronaves para essas missões?
Nosso País é carente de meios de transporte rodoviário, ferroviário e aéreo, necessitando do poder público para atendimento de certas necessidades críticas como no transporte de órgãos. Este sempre foi um anseio da sociedade, o qual cumpríamos apenas com nossos próprios recursos de horas de voo, na medida do possível. Entretanto, após o Decreto Presidencial e a assinatura de um acordo com o Ministério da Saúde para ressarcimento dos custos das horas voadas, nossa atuação pôde ser ampliada. Assim, qualquer esquadrão da FAB pode ser acionado dependendo do trajeto em que o órgão precise ser transportado. Fruto disso, os aviões da FAB já transportaram mais de 300 órgãos em missões que chegaram a mais de 2.000 horas de voo até agora.
Assim, além de estarmos cumprindo essas missões que salvam vidas, é possível perceber a motivação e a sensação de dever cumprido por parte dos nossos militares, sejam os pilotos, os mecânicos, os profissionais de saúde, a tripulação ou aqueles que trabalham na coordenação e no apoio de solo. Cada envolvido nessas missões tem a certeza de que seu trabalho faz uma grande diferença para muitos brasileiros.
Ainda falando de missões voltadas à ajuda humanitária, foram realizadas muitas operações acionadas a partir de desastres naturais ou acidentes, como o incêndio no Chile em janeiro deste ano, a enchente no Peru em março e o resgate das vítimas do acidente da Chapecoense no fim de 2016. O senhor acredita que esse papel solidário da FAB é uma referência?
Sim. Acredito que não só a FAB, mas o Brasil tem um histórico de solidariedade, de sempre estar à disposição dos vizinhos quando necessitam. No caso das missões de ajuda aos outros países, isso demonstra a amizade e a diplomacia que existem na América do Sul e isso é, claramente, recíproco. O apoio que os brasileiros tiveram na Colômbia, após o acidente com o avião que transportava a equipe da Chapecoense, e o tratamento que recebemos até hoje naquele país, são provas de que a solidariedade não é exclusiva do Brasil.
É importante ressaltar, ainda, que nossos militares atuam nesse tipo de missão sempre que necessário e quando acionados pela Presidência da República ou pelo Ministério da Defesa, inclusive nos resgates ou atendimentos aos brasileiros.
Na reestruturação da Força Aérea foi adicionada à Missão da FAB a atividade de integrar o território brasileiro – “Manter a soberania do espaço aéreo e integrar o território nacional, com vistas à defesa da Pátria“. O senhor diria que essa mudança oficializa algo que já vinha sendo realizado?
Com certeza. As missões de integração não são operações subsidiárias e estão no mesmo nível da manutenção da soberania do espaço aéreo. Essas missões fazem parte da FAB desde a sua criação, em 1941, quando o Correio Aéreo Nacional (CAN) era responsável pela entrega de correspondências em todas as regiões do Brasil.
Além disso, o apoio da FAB na Amazônia, seja levando mantimentos aos Pelotões de Fronteira, seja realizando transporte de doentes e feridos de locais isolados a hospitais, é algo também realizado há muito tempo. O próprio transporte de órgãos, de que já falamos, ou o transporte de urnas durante as eleições para comunidades mais afastadas, tudo isso faz parte da integração do território nacional e, em um país com as dimensões continentais do Brasil, a FAB cumpre muito bem este papel.
Quais as perspectivas de Comando para o próximo ano?
Para 2018, a consciência das dificuldades políticas e econômicas pelas quais passa nosso País não deve afetar nossa vontade de construir uma Força Aérea melhor. Devemos aproveitar este momento de transição na recuperação econômica para nos prepararmos para o futuro. Nossa expectativa é continuar o processo de renovação e consolidar novos conceitos. Estaremos também implementando fortemente a área de formação e capacitação para que nosso efetivo acompanhe as novas tecnologias inseridas na Força Aérea, por meio de novos equipamentos e sistemas de armamentos.
Nossos programas de formação e pós-graduação estão se adequando às novas necessidades. Além disso, cursos de especialização, mestrado e doutorado serão incentivados para que a qualidade de nossos militares faça a diferença.
Também acredito que os dois projetos fundamentais para o futuro da Força Aérea estão mais próximos da realidade. A entrada em operação do KC-390, prevista para a metade de 2018, vai incrementar nossa aviação de transporte com a possibilidade de execução de uma ampla gama de missões. Pensando um pouco mais à frente, temos um grupo de oficiais especialmente designados para planejar a implantação do Gripen NG em Anápolis (GO). A implantação desta aeronave no início da próxima década será um salto significativo para a nossa Aviação de Caça. Não podemos deixar de citar também a questão espacial, estratégica – atividade indispensável – que está sob a nossa responsabilidade dentro do Ministério da Defesa e que precisa de um impulso para se tornar realidade. Nós o faremos.
Na área de divulgação da Força Aérea, pretendemos conscientizar nossa população com a campanha “Dimensão 22”, que se refere aos 22 milhões de quilômetros quadrados de território e espaço aéreo pelos quais a FAB é responsável na defesa, controle e integração. É um tema importante que queremos abordar e divulgar de maneira clara para toda a sociedade brasileira. Trata-se de um cenário imenso e que nos dá a dimensão da grandeza da atuação da Força Aérea.
Então, as perspectivas são coerentes com o momento atual e estou certo de continuar contando com a compreensão, o comprometimento, a lealdade e o empenho de todo o efetivo no cumprimento de suas missões.
FONTE: FAB