Projeto da Força Aérea Brasileira pode revolucionar propulsão de veículos espaciais

A Força Aérea Brasileira desenvolve um protótipo de aeronave de propulsão hipersônica aspirada, integrando a tecnologia hipersônica com motor a combustão supersônica, que coloca o Brasil na elite da tecnologia espacial.

Tenente Norton Assis, pesquisador de hipersônica, e Israel Rêgo, chefe do Laboratório de Aerotermodinâmica e Hipersônica do IEAv, com a maquete do 14-X. (Foto: Sgto Alexandre Manfrim/FAB)

Por Nelza Oliveira

A Força Aérea Brasileira (FAB) está desenvolvendo um protótipo não-tripulado de uma aeronave por propulsão hipersônica com motor a combustão supersônica. O projeto estratégico da FAB, batizado de Prohiper, poderá revolucionar a propulsão de veículos espaciais do país.

A propulsão hipersônica propriamente dita – que é qualquer tipo de propulsão aeroespacial que sustente o voo de um veículo na atmosfera terrestre, a velocidades iguais ou superiores a cinco vezes a velocidade do som (Mach 5) – já é desenvolvida há vários anos pelo Instituto de Estudos Avançados (IEAv), no estado de São Paulo, na maior parte dos seus veículos de sondagem e no Veículo Lançador de Satélites. A diferença no Prohiper é que a propulsão hipersônica é realizada com o motor Estato Reator a Combustão Supersônica, conhecido também por “SCRamjet” ou “Supersonic Combustion Ramjet”, que utiliza o ar atmosférico como oxidante, carregando apenas o combustível no veículo. As duas tecnologias integradas ganham o nome de Propulsão Hipersônica Aspirada.

Na forma convencional, a propulsão hipersônica é realizada através de motores de foguetes com propulsor sólido, com os veículos aéreos carregando em seu interior o combustível (álcool, hidrogênio ou querosene) e o oxidante (geralmente o oxigênio). O motor SCRamjet utiliza o próprio ar para queimar o combustível.

“A principal vantagem desse veículo é que ele reduz o peso total do veículo que vai ser lançado. Isso faz com que a carga útil levada pelo veículo lançador possa ser mais pesada. E uma vez que ele não leva o oxidante junto no seu interior, o veículo torna-se mais seguro e essa redução de peso agrega para a sua eficiência”, explicou o Tenente Norton Assis, pesquisador de hipersônica, em vídeo de divulgação do projeto enviado pela FAB. “Um motor empregando essa tecnologia energética é capaz de realizar, por exemplo, uma viagem de Congonhas (em São Paulo) até Nova York em aproximadamente uma hora, uma vez que ele é capaz de alcançar uma velocidade de 12 mil quilômetros por hora, o que corresponde a dez vezes a velocidade do som”, completou.

Teste em laboratório

O primeiro protótipo, batizado de 14-X, que demonstra a tecnologia, existe, por enquanto, em um modelo que lembra o formato de uma asa delta com cerca de 80 centímetros de comprimento. O 14-X está sendo testado apenas no Laboratório de Aerotermodinâmica e Hipersônica Professor Henry T. Nagamatsu, do IEAv, onde está o maior túnel de vento da América Latina.

“O IEAv tem feito ensaios em laboratório de componentes importantes desses motores, também chamados de SCRamjets, como a entrada de ar e o combustor”, contou o Major engenheiro Tiago Cavalcanti Rolim, gerente do Projeto Prohiper 14-X e chefe da Divisão de Aerotermodinâmica e Hipersônica – Subdivisão Experimental, do IEAv. “O intuito é o de entender alguns aspectos dos escoamentos hipersônicos e supersônicos com combustão, monitorando propriedades-chave, como a pressão e temperatura, e estabelecendo relações de causa e efeito”, acrescentou.

O Maj Rolim explicou que os atuais veículos lançadores em uso dotados de sistemas de propulsão convencional podem levar em carga útil em torno de 4 por cento do seu peso. Graças à ausência dos tanques de oxigênio, a tecnologia do 14-X permite o transporte de até 15 por cento de carga útil em relação ao peso da aeronave.

“De fato, aproximadamente 65 por cento do peso desses veículos no instante do lançamento corresponde ao peso de oxigênio armazenado”, explicou o Maj Rolim. “Como meio de mitigar essa situação, novas tecnologias têm sido investigadas com o objetivo de aumentar a fração de peso de carga útil e, como consequência, diminuir custos. Há, pois, um consenso na comunidade científica de que esse novo sistema de propulsão aeroespacial poderá ser utilizado como estágio em veículos de acesso ao espaço”, declarou.

Brasil na elite da engenharia espacial

Na área espacial, onde as rigorosas limitações de combustível para o lançamento de cargas úteis em órbita demandam uma contínua redução de tamanho, peso e consumo de energia dos veículos lançadores, o Prohiper coloca o Brasil em sintonia com as poucas e seletas potências que testam essa tecnologia. O Maj Rolim afirmou que a pesquisa e desenvolvimento de demonstradores tecnológicos da propulsão supersônica aspirada têm crescido nas últimas décadas em diversos centros de pesquisa ao redor do planeta. Um dos países que se destacam no desenvolvimento dessa tecnologia é os Estados Unidos. Ele cita os projetos americanos HIFiRE, desenvolvido em conjunto pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos e pela Organização Australiana de Ciência e Tecnologia de Defesa, e o HYPER-X, com pesquisas iniciadas em 1996 e recordes de voo já registrados.

“A grande motivação desse projeto é a de que a gente consiga dentro de um horizonte de dez anos proporcionar à FAB um produto de defesa que permita a gente realizar voos rumo ao espaço de maneira mais barata e levando mais carga útil para o espaço”, afirmou Israel Rêgo, chefe do Laboratório de Aerotermodinâmica e Hipersônica do IEAv. A Aeronáutica brasileira pretende iniciar em 2020 o teste em voo com o demonstrador tecnológico 14-X. “Queremos hoje sair do nível laboratorial e dar o grande salto que é para o nível de qualificação em voo dessas tecnologias”, disse Israel Rêgo.

FONTE: Diálogo Américas

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