1964 na Base Aérea de Santa Cruz

Em 10 de março de 1964, no F-8 nº 4438 fiz meu vôo solo.

Havia chegado o grande dia!

Para mim, era mais um dia normal. Notei, porém que parecia um dia diferente e não sabia o porquê. Recém casado, ainda em plena lua-de-mel, acordei, vislumbrei feliz minha mulher que ainda dormia e olhei para a janela. Estava um dia maravilhoso, um dia de céu claro, sem nuvens e a temperatura agradável dos meses de março no Rio de Janeiro.

Cheguei no “Segundão” na hora do início do expediente, verifiquei o “Quadro da Escala do Vôo e havia sido escalado para voar solo, as 9 hs no F-8 Nº 4438. 20 minutos antes da hora marcada, peguei o equipamento de vôo e dirigi-me para a pista de estacionamento, no pátio sul do Hangar “do Zepelim”.

Esperava-me o Cb. Lair ao lado do avião 4438. Informou-me que o avião estava totalmente disponível, sem panes, e entregou-me o registro de vôos da aeronave. Todo o ritual pré-vôo cumprido, sentei-me na cadeira do piloto. Ajudado pelo mecânico a amarrar-me, para quedas e cadeira, coloquei o capacete de vôo, fiz as conexões de radio/oxigênio, e preparei-me para dar a partida nos motores. Por incrível que pareça, ainda não tinha me dado conta que estava prestes a voar o avião de meus mais belos sonhos de criança.

Gloster Meteor. F-8 nº 4438

Dei a partida nos motores e taxiei para a cabeceira da pista 04. Autorizado a decolagem, via rádio, alinhei o avião na pista, efetuei o cheque de decolagem e empurrei as manetes de potência todas à frente. Decolagem normal, trem de pouso recolhido, “comecei a pegar” velocidade.

A partir de 200 nós, eu levei um “susto”.

Iniciava-se nesta velocidade o barulho característico do F-8. Diferente do TF-7, o F-8 possuía instalado no seu nariz, quatro canhões de 20 mm. A força do vento na boca desses canhões provocava um barulho surdo que encantava a todos no solo e que desde garoto eu sonhava com aquele barulho: o som de meu ideal. Eu não sabia que o piloto, de dentro da aeronave, ouvia o mesmo barulho dos que estavam no chão.

Nesse exato momento, extasiado pela surpresa, dei-me conta que estava vivenciando, na realidade, um sonho e senti-me o homem mais feliz do mundo, havia alcançado o meu ideal de vida. Foi a segunda vez que agradeci a Deus uma graça alcançada. Olhei para aquele subúrbio do Rio de Janeiro e imaginei, em uma daquelas casinhas, ficando cada vez menores, um menino de uns 12/14 anos, ao ouvir o som do F-8 e extasiado olhando aquele “pássaro” de bico vermelho, dizendo para si mesmo num murmúrio: “ainda vou voar aquele avião”.

Antes não, porém agora eu sabia que o Gloster Meteor. era um Caça-Bombardeio inglês, monoplace, equipado com duas turbinas Rolls-Royce modelo Derwnt 8, velocidade máxima de 590 mph, armado com 4 canhões de 20mm e uma capacidade de carregar sob as asas, dentre outras opções, 2 bombas de 450 k ou 4 foguetes HVAR 5.

Voltando ao início do ano, apresentei-me na Base Aérea de Santa Cruz, Rio de Janeiro, no dia 27 de janeiro de 1964 e classificado no 2º/1º Gav. Ca, Esquadrão Rompe Mato, em 19 de fevereiro do mesmo ano.

Após a instrução de solo da aeronave F-7. minhas horas de instrução foram:

Após 05h15min duplo comando fui considerado apto a pilotar o TF-7 tendo sido checado pelo Maj. Dias. Como aviador jovem não tinha ainda me dado conta da importância desse vôo. Eu estava me tornando um piloto efetivo do 1º Grupo de Aviação de Caça da Força Aérea Brasileira de tantas glorias e tradições desde a II Guerra Mundial.

O vôo solo no TF-7 foi tranqüilo e despreocupado. O hábito de voar uma nova aeronave já não me causava qualquer tipo de ansiedade. Voar era a minha vida, a minha profissão, meu “hobby”, a minha diversão.

TF-7 Nº 4308 do 1º Gav Ca

Hoje, recordando meus tempos de aviador, dou-me conta que nunca “trabalhei” no sentido denotativo da palavra trabalho. Eu passei toda a minha vida profissional me divertindo. Durante todos esses anos, e foram mais de 40, levantei todas as manhãs com aquela alegria, prazer e vontade de ir “trabalhar”. Creio ter acertado na escolha que fiz em ser aviador, caçador brasileiro melhor ainda.

Voei F-8 no 1º Gav.Ca durante 5 anos até ele ser retirado de serviço em 1968. Meu último vôo, como também daquela aeronave, foi no nº 4455 entre as cidades de Londrina e Rio de Janeiro no regresso da “Operação Xavante” que comentarei mais tarde. Quando o 4455 começou a ser desmontado, retirei pessoalmente a cabeça do manche e coloquei-o num pedestal de madeira.

Guardo-o com muito carinho essa lembrança, pois representa, fisicamente, a realização de um ideal de vida.

Cabeça do manche do F-8 nº 4455

Comparando com o que diz o dicionário sobre a palavra ideal, como a síntese de tudo o que aspiramos, de toda a perfeição que concebemos ou se pode conceber, ou ainda aquilo que é objeto da nossa mais alta aspiração intelectual, estética, espiritual, afetiva ou de ordem prática, o meu ideal, em particular, acredito ter sido muito estranho, ou pelo menos diferente. Meu ideal era voar um determinado avião, não qualquer um, mas, especificamente o F-8. Não era um projeto de vida, algo permanente ou qualquer outra coisa duradoura. O meu ideal realizou-se num átimo de segundo, no momento exato em que ultrapassei a velocidade de 200 nós e ouvi, de dentro do “cockpit”, aquele ruído característico das aeronaves F-8 em vôo. A felicidade daquele momento durou toda a minha vida profissional e continuou após minha passagem para a reserva da FAB, mesmo voando aviões Ultraleves.

Lembro-me, com exatidão, de vários vôos daquela época.

O primeiro deles, quase fui preso por um General do Exército, anos mais tarde Presidente da República, Emílio Garrastazu Médici. Em 1964, ano da Contra Revolução, ele era o Comandante da Academia Militar das Agulhas Negras tendo o meu pai, na época Coronel do Exército, como seu Diretor de Ensino.

Logo após o solo de F-8, eu estava tão contente que queria mostrar o que tinha conseguido aos meus pais. Moravam na Vila Militar em Rezende, Estado do Rio, onde situa-se a Academia Militar das Agulhas Negras do Exército.

Decolei de Santa Cruz e rumei, imediatamente para Resende. Ao chegar a cima da cidade, bastante alto, localizei a casa de meus pais na entrada da Escola. Mergulhei fundo e a poucos metros do chão, devia estar com uns 500 nós de velocidade, mais ou menos uns mil km por hora, passei em cima da casa e ao ultrapassar o portão da Escola, alinhei com a entrada monumental que terminava no prédio do Comando. Passei por várias vezes pelo mesmo caminho fazendo diversas acrobacias. Satisfeito, pois meus pais deveriam ter-me notado, regressei para Santa Cruz feliz da vida.

Portão da AMAN com o Prédio do Comando ao fundo

Entrada da AMAN

A noite, daquele dia, eu estava em casa, jantando com minha mulher, quando ouvimos alguém batendo na porta. Levantei-me e fui atender. Surpresa completa: na porta estava meu pai, sozinho e com um ar bastante sério. Quase não nos cumprimentou e disse-me em tom grave:

“Meu filho, a próxima vez que fizeres o que fez hoje, em Rezende, vou te dar 30 dias de cadeia por indisciplina.” Nem entrou na minha casa despediu-se e retornou para Rezende.

Tempos depois, minha mãe relatou-me o que tinha acontecido naquele dia na cidade e na Academia Militar do Exército. Disse-me ela que eu havia passado tão baixo, em cima da casa, que a roupa do varal de secagem, no quintal, enrolou-se toda na corda. O jornal da cidade, no dia seguinte, postou um artigo de primeira página, comentando o vôo do jato em cima da cidade o que, praticamente, dividiu-a. Uns achavam que o piloto da FAB era um irresponsável e indisciplinado, outros que o achavam um herói, pois tinha presenteado a população com um “show” de acrobacias e os tinha retirado de uma rotina de cidade do interior. O relato de minha mãe não acabava ai. Contou-me que ao ouvir o som característico do F-8, meu pai e o General Médici dirigiram-se para a varanda do Gabinete do Comando que ficava situado no 3º andar do prédio e bem na frente da entrada monumental da Escola.

Em uma das passagens, ultrapassei o portão de entrada e “colei” o F-8 no chão. Pouco antes do prédio, puxei o manche com violência e passei raspando no teto da edificação.

Meu pai e o General Médici jogaram-se no chão.

Disse minha mãe que só não fora preso ao pousar em Santa Cruz por que os dois eram muito amigos e o General Médici recomendou ao meu pai que me admoestasse verbalmente.

Bem, aqui cabe um comentário particular. As famílias de meus pais e a do Gen. Médici, ambas de Bagé no Rio Grande do Sul, eram amigas de várias gerações. Eu, desde pequeno, chamava o General Médici pelo seu apelido familiar, “Tio Milito”. Sempre serviram juntos o Exército em Bagé, Porto Alegre, Rezende e em Brasília. Por essas razões foi que a FAB nunca soube da temeridade e indisciplina de um de seus pilotos de Caça.

O evento ficou restrito a ambas as famílias, embora tenha interrompido a instrução dos Cadetes do Exército naquele dia.

Nunca mais passei voando perto daquela cidade……..

Como já comentado, foram quatro anos voando no meu ideal. Vários vôos foram memoráveis e inesquecíveis dentre muitos realizados, pois voávamos todos os dias e muitas vezes a noite.

Um deles foi minha primeira viagem de instrução de TF-7 nº 4307, entre os dias 17 e 19 de setembro de 1964, para Fortaleza tendo como instrutor o Ten. Danilo Orlando.

TF-7-4309 MUSAL

O Ten. Orlando era um ano mais antigo que eu e o conhecia bastante bem, pois alem de termos o mesmo nome, convivemos vários anos na Escola de Aeronáutica como cadetes. Tinha uma personalidade introvertida, jamais fazia qualquer brincadeira e raramente o vimos sorrir. Levava tudo muito a sério e como era um atleta e aparentemente muito forte, logo seus colegas de turma lhe aplicaram um apelido bastante peculiar de “Alavanca”.

Escalado para a viagem, decolamos de Santa Cruz as 16 h com a previsão de pousos intermediários em Vitória, Salvador e Recife. Na etapa Recife – Fortaleza, decolamos em torno da meia noite e na subida para 25 mil pés comecei a sentir que algo não estava bem. Em cada etapa, trocávamos de posição na nacele do TF-7. Ao decolarmos de Recife, o Alavanca estava pilotando na cadeira dianteira e eu atrás, distraído e admirado com a lua cheia emoldurada por aquele céu estrelado peculiar da região nordestina.

Em certo momento, ao cruzarmos 20 mil pés, comecei a ouvir alguns sons do Alavanca pelo interfone. Cantarolava uma canção italiana, lembro nitidamente dos acordes do “Sole Mio”. Achei estranho, devido a sua personalidade, e o chamei pelo interfone:

– Orlando, está tudo bem? 

Sua resposta foi desconexa e comentou que a noite estava maravilhosa, o céu lindo como uma poesia noturna, o infinito do céu com suas estrelas davam-lhe a dimensão do universo e as luzes da cidade pareciam brilhantes bordados em um veludo azul marinho.

Imediatamente soou um alarme na minha cabeça. Alguma coisa estava errada e muito errada. Rapidamente recordei tudo o que havia aprendido, lido e ouvido sobre aviação tentando encaixar uma reação tão estranha de um piloto que conhecia bastante bem. Localizei as reações do Orlando quando me lembrei dos treinamentos que fizemos ainda cadetes, na Câmara de Descompressão. Ele estava sofrendo os efeitos da anóxia, ou seja, falta de oxigênio.

Notei, também, que meu raciocínio estava um pouco lerdo, porém com o alarme na minha cabeça, devo ter lançado alguns “litros” de adrenalina no meu sangue e acionei o interfone: O diálogo nesse momento foi:

– Orlando, meu amigo, você está vendo uma torneira redonda, a direita na parte inferior do painel?

– Estou sim, tem uma lá.

– Orlando, então coloque a mão direita nela e gire-a no sentido anti-horário, como se abrisse um registro d’água.

– Ta legal vou fazer isso porque você está pedindo, mas não sei o que você está querendo.

Imediatamente, senti uma lufada de oxigênio enchendo meus pulmões e invadindo o meu cérebro, clareou o meu raciocínio. O mesmo aconteceu com o Alavanca.

Quando ele assumiu conscientemente os comandos da aeronave, demo-nos conta que estávamos voando em direção nordeste, praticamente para o meio do oceano Atlântico. Retornamos na direção de Fortaleza e como ainda estávamos no início do vôo, tivemos combustível suficiente para chegarmos tranquilamente em Fortaleza.

O que aconteceu, foi que no cheque após a partida dos motores, o Orlando havia esquecido de abrir a torneira do Oxigênio. Ao contrário do F-8, o TF-7 não fornecia oxigênio automaticamente após a partida.

Tínhamos então de abrir o Oxigênio para as máscaras de vôo através de uma válvula situada a direita e a baixo do painel dianteiro da aeronave. Se eu não conhecesse bem a personalidade do Orlando, teríamos caído no mar e no meio da noite, inconscientes e a umas 200 milhas após Fernando de Noronha, em direção da Europa. Ninguém iria saber o que tinha acontecido, bem como as causas do completo desaparecimento daquela aeronave.

O Alavanca, como era de se esperar, nada comentou comigo.

1964 foi o ano da chamada Revolução, que nada mais foi do que uma Contra-Revolução. Afirmo isso por que um meu instrutor de caça de Fortaleza afirmou a um colega caçador que se o comunismo tivesse sido o vencedor, seria ele, o instrutor, que estava escalado para matar meu colega caçador. Este era declaradamente contra a implantação de um regime comunista no Brasil. Parece mesmo que a revolução comunista estava planejada detalhadamente.

Durante o mês de maio, executamos várias missões operacionais de intimidação em função da Contra Revolução.

Em uma delas, 4 F-8 decolaram de Santa Cruz, comandadas pelo Cap. Gaio (José Macieira), para Santos (SP) em virtude de um protesto esquerdista nas Docas de Santos.

Ao entrarem no canal, a baixa altitude, em torno de 300 kt, o F-8 do líder, Cap. Gaio, bateu em um fio de alta tensão que atravessava o Canal. O avião, com o choque, foi jogado em direção ao mar e afundou ocasionando a morte do piloto. Esse acidente creio que foi o único “atrito”da FAB no período bélico revolucionário.

Nessa fase pós-revolução fizemos varias manobras e treinamentos com o Exército em Missões de Apoio Aéreo Aproximado. Em uma manobra conjunta com o Exército, na área de Macaé, RJ, decolamos com 8 Gloster. Após, aproximadamente, uma hora de vôo e finda a missão regressamos a Santa Cruz pelo litoral. No regresso a vinte mil pés e já adentrando na área da restinga da Marambaia, alcançamos várias pequenas explosões a frente das aeronaves.

No início ninguém entendeu nada até que alguém gritou pelo rádio: “É flack!!!! É flack!!!!

O líder, imediatamente, fez um “break”(curva apertada) para a direita. Nenhum avião foi atingido. Mais tarde, já no solo, confirmamos que havia um Aviso Aeronáutico proibindo o sobrevôo daquela área em virtude de um treinamento de tiro anti-aéreo executado pelo Exército. Aqueles oito pilotos foram os únicos a vivenciarem um ataque real de canhões anti-aéreos, desde a campanha do 1º Grupo de Caça na Itália. No Brasil, só nós e os veteranos de guerra tiveram esta experiência.

Um vôo interessante, agora de L-6 “Paulistinha”, foi por ocasião do acidente, de F-8 matrícula 4453.

No dia 05 de agosto de 1964 o Cel. Berthier decolou para uma missão isolada com uma autonomia de vôo, de aproximadamente uma hora de duração. Quando a autonomia do Gloster havia chegado ao fim e a aeronave não havia pousado, tivemos certeza que o Comandante acidentara-se em algum lugar da área de instrução, acima das montanhas da Serra do Mar em direção a São Paulo. Foi montado na Base, logo a seguir, um Plano de Busca. Iríamos voar toda a área até localizar os destroços da aeronave. Fui escalado para voar na aeronave L-6 em um dos setores selecionados. Estava um céu claro e com boa visibilidade.

Cheguei ao portão norte do hangar e o L-6 nº 3089 estava lá me esperando. Mandei chamar o mecânico, Cb. Queiroz, por um motivo bastante simples. Eu nunca havia voado um L-6 e não sabia nem dar a partida no motor. Auxiliado pelo mecânico, dei a partida no avião, taxiei para a cabeceira da pista e decolei.

L-6-3095 preservado no MUSAL

Na subida, fiz um “stall” (reduzir o motor e deixar o avião nivelado até que ele perca a sustentação) para saber qual a velocidade mínima que o avião voava. Prossegui subindo e voei, aproximadamente, uma hora.

Notei, durante o vôo, que uma varetinha, bem a frente do piloto, estava gradativamente diminuindo de tamanho. Desconfiado, interrompi a busca e voltei para o pouso sem localizar os destroços.
Dias mais tarde, ao comentar com alguns outros pilotos, o movimento estranho daquela varetinha soube que era o medidor mecânico do nível de combustível no tanque da aeronave. Ainda bem que havia interrompido aquele vôo, pois poderia ter ficado sem combustível e seria mais outro avião para procurar os destroços no meio das montanhas vizinhas a Santa Cruz.

Os destroços do avião do Cel. Berthier foram encontrados no sopé de uma montanha, próximo a Santa Cruz, em direção a São Paulo. Soubemos mais tarde que ele entrara em combate com uma Esquadrilha de 3 aviões que cumpriam uma missão de treinamento naquela área. 3 contra um, realmente, o Cel. Berthier não tinha nenhuma possibilidade de êxito. Para não ser “encaudado”, adentrou nas nuvens que cobria a Serra do Mar, colidindo frontalmente em uma montanha. O Cel. Berthier era um bom piloto, sabia disso e era vaidoso. Lembro que morava na Zona Sul do Rio e nos finais de expediente escalava a um “novinho” para levá-lo ao Santos Dumont de Fokker T-22. Em uma dessas “pernadas” fui escalado. Durante o vôo de ida, falou-me e executou o que considerava ser um bom piloto. Abriu uma caixa de fósforos e a colocou em cima do painel do T-22. A seguir, fez um tounaux a baixa altura e nenhum palito caiu da caixa aberta. Desconheço o porquê de nunca ter tentado fazer isso.

Essas histórias destinam-se a relatar somente “causos’ de aviação, porém vou abrir uma exceção.

Em meados de junho ou julho, fui escalado a Oficial de Dia da Base. Como estávamos vivendo um período revolucionário, cheio de ameaças de terrorismo por parte dos vencidos, reuni a equipe de serviço naquela noite e dei instruções bastante precisas. Qualquer pessoa que circulasse perto da entrada da Base, o militar de serviço, um soldado, deveria prendê-la e trazer-me para averiguações. Não deu outra…..

Naquela noite o Comandante da Base, Cel. Burnier, havia convidado o Cmt. do Quartel de Engenharia Vilagran Cabrita, também sediado em Santa Cruz, para um jantar.

Após eu soube, que os dois comentavam a fragilidade das instalações da Base devido a sua enorme área e a falta de consciência dos subalternos do que estava acontecendo no País. Para provar isso, o Cel. Burnier sugeriu seu convidado a irem a pé até o Portão da Guarda da Base.

No meio do caminho, em frente a Vila dos Oficiais, ouviram uma voz saindo da escuridão da noite:

– Alto!!!! Identifiquem-se!!!

O Cel. Burnier tentou identificar-se, mas o soldado nem ouviu, engatilhou o fuzil e gritou:

– Mãos ao alto, atrás da cabeça, e caminhem em direção ao Portão da Guarda!!!

Qual não foi a minha surpresa ao ver o Comandante da Base, acompanhado por outra pessoa, rendidos por um pracinha, sob meu comando e de mãos ao alto, adentrando na Base. O susto, as desculpas e explicações foram imediatas. O soldado declarou que estava muito escuro e que não reconheceu seu Comandante mantendo-se sempre a distância “dos suspeitos”.

Por incrível que pareça recebi um elogio pela minha atuação como Oficial de Dia.

Fora os dois acidentes, alguns IPM (Inquéritos Policiais Militares) e prisões de simpatizantes da causa errada, o ano de 1964 transcorreu normal em termos de atividades aéreas. Muitos vôos de treinamentos operacionais, lançamentos de bombas e foguetes no stand da Marambaia, viagens de instrução e manobras conjuntas com o Exército e Marinha Brasileiros.

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