General brasileiro na ONU descarta apoio a Exército no Congo

O general Carlos Alberto dos Santos Cruz comanda a força da ONU no Congo

Por Isabel Fleck

Mesmo com mandato que autoriza uso da força, comandante da missão no país diz que não é o momento de lutar ao lado de tropas locais

O general brasileiro Carlos Alberto dos Santos Cruz está, há pouco mais de um mês, à frente do maior contingente da ONU: 19 mil militares. É também o primeiro comandante de forças de paz a ter um mandato que permita operações de ataque.

No entanto, diante do violento conflito entre o Exército congolês e o grupo rebelde M23 – que recrudesceu na última semana -, o novo comandante da Monusco, a missão da ONU para a República Democrática do Congo, descarta apoiar agora as Forças Armadas do país.

“Há um processo político aberto e, quando se tem um processo político aberto, a ação militar precisa estar coordenada com ele”, afirmou Santos Cruz à Folha, por telefone, de Kinshasa.

O general diz que “operações conjuntas com o Exército são possíveis”, mas assegura que não vai lutar ao lado dos congoleses no momento.

A reticência não se deve apenas às atuais conversas entre representantes do M23 e do governo do Congo, que ocorrem sob a mediação de Uganda.

A ONU também quer investigar se, nos últimos dias, houve abuso das forças do país nos combates contra o M23, que deixaram mais de 130 mortos. Há denúncias de maus-tratos contra detidos e de profanação de corpos dos rebeldes. Em maio, militares congoleses foram acusados de estupro.

“Neste tipo de ambiente, há muitas alegações, e essas coisas têm que ser investigadas. Para que [o Exército] tenha apoio da ONU, não podem existir denúncias de direitos humanos”, afirma o general.

Na quarta passada, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, disse que a Monusco irá rever seu apoio “”que hoje é logístico e de treinamento– às unidades do Exército envolvidas nas acusações. As declarações levaram um grupo de 200 civis a protestar, dois dias depois, diante da base da missão em Goma, em apoio às Forças Armadas congolesas.

O Conselho de Segurança da ONU definiu, em março, um novo mandato para a missão iniciada em 2010, criando uma “brigada de intervenção”, com 3.000 homens, autorizada a usar a força para “neutralizar e desarmar” grupos rebeldes.

A nova resolução também estabeleceu o reforço do efetivo da missão na região de Goma (leste), na fronteira com Ruanda, epicentro dos violentos combates entre as Forças Armadas e o M23.

“[O mandato] autoriza ofensivas preventivas a fim de impedir massacres contra a população civil”, explica. “Você tem dezenas de grupos armados que cometem atrocidades contra a população das vilas. Se houver informação suficiente, vamos proteger os civis com força total.”

Atualmente, a ocupação dos cerca de 6.000 militares na região é manter a segurança em Goma e no campo com mais de 130 mil refugiados nos arredores da cidade.

Para Santos Cruz, que já comandou as tropas da ONU no Haiti (2007-2009), as grandes distâncias e a tensão política com países de fronteira são os principais complicadores no Congo. Na última semana, Ruanda acusou a Monusco de conexão com grupos hutus ligados ao genocídio de 1994. A ONU exigiu provas.

“[O conflito] envolve muitos interesses e grupos diferentes”, afirma o brasileiro. “Se conseguirmos ao menos parar a violência contra a população, já será uma vitória.”

FONTE: Folha de São Paulo

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