Sem orçamento, Defesa adia projeto estratégico até 2040

KC-390 da Embraer sobrevoando o Chile durante a FIDAE 2018



Por Carla Araújo e Daniel Rittner

Para manter vivos e sem cortes seus projetos estratégicos de modernização, as Forças Armadas têm recorrido a renegociações contratuais que dilatam o prazo de entrega de novos equipamentos. A falta de recursos orçamentários no curto prazo faz com que projetos iniciados na década passada tenham, em algumas situações, cronograma ajustado até para um longínquo ano de 2040.

Um levantamento do Ministério da Defesa sobre o andamento financeiro de 12 programas mostra que já foram desembolsados R$ 38,2 bilhões. Só que faltam ainda mais R$ 93,5 bilhões. Diante da fragilidade fiscal, a repactuação dos prazos foi a saída encontrada pelos militares para honrar os compromissos com parceiros e fornecedores sem reduzir o escopo dos programas.

“Não tem mágica. Só pode fazer duas coisas para cumprir os contratos: ou a gente muda o escopo dele, refaz e diminui o projeto, ou a gente alonga o prazo”, afirmou ao Valor o ministro Fernando Azevedo e Silva. Segundo ele, não são apenas os valores alocados no orçamento da Defesa que importam, mas a previsibilidade dos recursos ao longo do tempo. “Todo ano é uma briga orçamentária, e os projetos acabam sofrendo por causa disso.”

No fim do mês passado, a pasta teve o segundo maior contingenciamento da Esplanada dos Ministérios, ficando atrás somente do da Educação. O bloqueio foi de R$ 5,1 bilhões – 38% do orçamento original para 2019. Azevedo acredita que esse corte temporário possa ser revertido ao longo do ano e aposta em mais recursos a partir de 2020, quando vai ser executado o primeiro Orçamento formulado pelo governo Jair Bolsonaro. “Eu tenho esperança na origem militar do presidente e no discurso dele em relação às Forças Armadas.”

As repactuações contratuais, no entanto, levam frequentemente a um encarecimento dos projetos. Um caso emblemático é o do HX-BR, que envolve o desenvolvimento e a produção de 50 helicópteros – 16 para o Exército, 16 para a Aeronáutica e 16 para a Marinha, além de outros dois para transporte de autoridades. Por falta de dinheiro das Forças Armadas, apenas 30 das 50 unidades foram entregues até o fim de 2017, quando deveria ter sido concluído o projeto. Os últimos ficaram para 2022. A francesa Airbus Helicopters, que produz os equipamentos por meio de sua subsidiária Helibras em Itajubá (MG), já obteve reequilíbrio econômico-financeiro do contrato no valor de € 44 milhões. Agora, pleiteia mais € 33 milhões devido ao atraso, conforme apurou o Valor com fontes militares.

A dilatação mais extensa de cronograma atinge o programa de blindados Guarani. Fruto de uma parceria entre o Exército e a fabricante italiana Iveco, esse veículo anfíbio com capacidade para até 11 tripulantes está sendo produzido no complexo industrial de Sete Lagoas (MG). A ideia original era ter 120 blindados por ano até 2029. No novo cronograma, com 60 unidades anuais, o projeto foi estendido para 2040.

Um fator de incerteza para os programas está no teto de gastos. A emenda constitucional, uma das principais bandeiras do então presidente Michel Temer para o controle das contas do governo, impôs um limite para as despesas públicas. Elas só podem ser corrigidas pelo IPCA durante 20 anos.

O paradoxo, segundo o ministro Azevedo, é que a grande maioria dos projetos estratégicos da Defesa foi contratada antes do teto constitucional. Por isso, muitos têm uma previsão de investimentos crescentes nos próximos anos. Na avaliação de Azevedo, é possível que Bolsonaro ou um governo posterior tenha que rever o limite constitucional. “Acho que este governo ou o seguinte terá que mexer nessas normas.”

Os dois maiores projetos da FAB – a compra de 36 caças de múltiplo emprego Gripen NG e dos cargueiros táticos KC-390 da Embraer – chegam ao pico dos desembolsos praticamente ao mesmo tempo. Eles devem consumir, juntos, pouco acima de R$ 4 bilhões por ano entre 2021 e 2023. Em 2019, sem levar em conta o contingenciamento de março, a previsão era gastar R$ 1,35 bilhão com os Gripen e R$ 750 milhões com os KC-390.

FONTE: Valor Econômico



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