Ação da ONU no Congo levou a recuo rebelde, diz general brasileiro

General que liderava tropas destaca rendição de mais de 5.000 insurgentes. Carlos Alberto dos Santos Cruz deixou missão no fim de 2015; desafios de sucessor são grupos armados e eleição.

Por Isabel Fleck

Quando chegou à República Democrática do Congo, em junho de 2013, para assumir a maior força de paz da ONU, o general brasileiro Carlos Alberto dos Santos Cruz deparou com a ameaça do grupo rebelde M23, que havia tomado a cidade de Goma, na fronteira com Ruanda, e tentava criar um governo paralelo.

Cinco meses depois, as tropas da ONU ajudaram o Exército congolês a derrotar o M23. O impacto foi visto não apenas em Goma, que retomou sua rotina, mas entre os cerca de 50 outros grupos rebeldes que atuam no país.

Segundo o brasileiro, que deixou o posto no fim de dezembro, mais de 5.000 combatentes de outros grupos se renderam voluntariamente após a queda do M23.

“A derrota do M23, que era o grupo armado mais forte, acarretou um grande número de rendições”, conta o general brasileiro, sobre o fenômeno que considera um dos principais legados de seu período à frente da Monusco (missão para estabilização do país).

Outro foi o sensível recuo do grupo rebelde Forças Democráticas Aliadas (ADF), que teve reduzida sua área de influência. O movimento teria permitido que cerca de 100 mil civis retornassem às suas casas nos arredores de Beni, na fronteira com Uganda.

“Mas as ADF continuam numa guerra assimétrica contra as Forças Armadas do Congo e as tropas da ONU e, paralelamente, com ações terroristas contra a população civil, sequestrando muita gente e matando de maneira bárbara”, disse Cruz, 63, à Folha.

Ajudar as forças congolesas a conter a ação das ADF será um dos maiores desafios de seu sucessor, o sulafricano Derick Mbuyiselo Mgwebi, avalia o general.

A milícia, que teria entre 500 e 1.000 integrantes, pela estimativa da ONU, matou cerca de 500 pessoas no último ano, segundo o ex-comandante, que voltou para o Brasil, onde é general da reserva.

“Eles também cometem atos de terrorismo, matam mulheres e crianças, só que não com carro-bomba, e sim com facão e machado”, diz.

ELEIÇÕES

A proximidade das eleições na República Democrática do Congo, previstas para novembro deste ano, pode trazer ainda mais instabilidade para o país, afirma Cruz, que também foi comandante das tropas da ONU no Haiti.

Em janeiro, uma tentativa do atual presidente Joseph Kabila, que assumiu em 2001 após o assassinato do pai, o então presidente Laurent-Désiré Kabila de adiar as eleições e estender o seu mandato gerou protestos violentos, nos quais morreram dezenas de pessoas.

Segundo o general, a ONU não tem condições de garantir a paz nas eleições. A Monusco possui cerca de 19 mil militares de 48 países, não há brasileiros em combate.

“Num país do tamanho do Congo, é uma grande ilusão achar que a ONU pode garantir a segurança da eleição”, disse, ressaltando que esta responsabilidade está nas mãos do Exército e da polícia.

“O Congo tem 80 milhões de habitantes. Só a província de Katanga tem a área da Espanha, e a ONU tem lá um batalhão de só 450 homens.”

FONTE: Folha de São Paulo

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