Brasil busca alcançar independência nuclear

O CTMSP desenvolveu uma cascata de enriquecimento isotópico, parte do programa nuclear naval brasileiro.

aramar

Por Nastasia Barceló

O Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo (CTMSP), com tecnologia inteiramente nacional, montou e fabricou uma cascata de enriquecimento isotópico, ou seja, um instrumento que separa o isótopo do urânio em partes para abastecer o Reator Multipropósito Brasileiro (RMB), que produz combustível nuclear. O RMB possui diversos objetivos vinculados à medicina nuclear, como o tratamento e o diagnóstico de câncer, além de poder ser aplicado em áreas como a agricultura e o meio ambiente. O projeto faz parte do programa nuclear da Marinha do Brasil, desenvolvido desde 1978.

O CTMSP está localizado no campus da Universidade de São Paulo e no Centro Experimental Aramar, no município de Iperó, também em São Paulo. As duas organizações militares foram inauguradas pelo governo do estado de São Paulo, entre 1986 e 1988, com o objetivo de desenvolver e estimular pesquisas úteis para a Marinha do Brasil, em conjunto com outras instituições públicas e privadas. A escolha do espaço para desenvolver pesquisas e projetos na área nuclear foi São Paulo, por ser este o estado que dispõe do melhor parque industrial, de escolas de engenharia e centros de pesquisa.

O CTMSP é o principal responsável pelo Programa Nuclear da Marinha do Brasil. O atual diretor do centro, o Contra Almirante André Luis Ferreira Marques, explicou à Diálogo que, durante os 30 anos de trabalho, destacaram-se três projetos na área nuclear: o Projeto do Ciclo do Combustível, o Projeto do Laboratório de Geração de Energia Nucleoelétrica e o Projeto de Infraestrutura.

A última inovação incorporada pelo CTMSP foi a cascata de enriquecimento isotópico que, ao facilitar a produção de combustível nuclear, oferece ao Brasil a independência no âmbito nuclear. A cascata, inaugurada em 8 de dezembro de 2016, tem a capacidade de enriquecer urânio até 19,95%.

“O RMB garante a independência nuclear do Brasil”, explicou o C Alte Ferreira Marques. “A finalidade é diminuir a independência externa no que diz respeito aos insumos utilizados nos procedimentos de pesquisa com produtos radiofarmacêuticos. Além disso, ele será utilizado nos testes de materiais e combustíveis usados na construção do submarino nuclear”, ressaltou o C Alte Ferreira Marques.

“O projeto do RMB foi desenvolvido desde que foram estabelecidas as metas do Plano de Ação do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações no ano de 2007; no entanto, somente em 2013 ele saiu do papel para começar a se tornar uma realidade”, assinalou o professor Dr. Luís Antônio Albiac Terremoto, pesquisador e membro do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares da Universidade de São Paulo (IPEN).

“Por meio da produção de isótopos radioativos, o Brasil conseguirá pagar esse grande investimento em, no mínimo, 20 anos”, destacou o Dr. Albiac.

De acordo com o site brasileiro Defesa Aérea e Naval (www.defesaaereanaval.com.br), a cascata de enriquecimento isotópico foi desenvolvida conjuntamente entre a Comissão Nacional de Energia Nuclear e a Fundação Parque de Alta Tecnologia da Região de Iperó e Adjacências, e financiada pela Financiadora de Estudos e Projetos.

“Com a implementação da cascata, é muito possível que a quantidade de produtos radiofarmacêuticos seja duplicada, abrindo a possibilidade de exportar o material excedente a um mercado que atualmente é dominado por Canadá, França, Holanda e África do Sul”, afirmou o Dr. Albiac.

O Dr. Albiac explicou que, entre os anos de 2009 e 2011, os reatores nucleares fabricados na Holanda e no Canadá enfrentaram uma profunda crise relacionada com o abastecimento de isótopos radioativos, o que trouxe como consequência a posterior suspensão de milhões de processos ao redor do planeta. Neste sentido, a inauguração da cascata é um grande feito para a ciência e para a tecnologia do Brasil.

Programa nuclear naval brasileiro

O programa nuclear naval brasileiro tem suas origens no ano de 1978. Entre suas conquistas, destaca-se o êxito em obter urânio ligeiramente enriquecido pela primeira vez em 1987. Como fruto desses avanços, em 1988 foi inaugurado o Centro Experimental de Aramar.

Em 1996, a Marinha do Brasil suspendeu a construção do submarino nuclear por falta de orçamento. No entanto, manteve modelos de submarinos nucleares de ataques no CTMSP em uma base naval, deixando claro que não desistia completamente dos planos.

Foi em agosto de 2005 que se anunciou que o primeiro protótipo nacional de um reator nuclear havia sido concluído e armazenado. Meses depois, o Brasil inaugurou a usina de enriquecimento de urânio de Resende.

Em 2007, a Marinha confirmou oficialmente que o Brasil retomava a construção do submarino nuclear através do documento estatal Estratégia Nacional de Defesa que destacava que, “Para garantir o objetivo de negação do uso do mar, o Brasil contará com uma força naval submarina de envergadura, composta por submarinos convencionais e submarinos de propulsão nuclear”, dando lugar ao surgimento do Programa de Desenvolvimento de Submarinos.

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