Forças desafinadas

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A compra dos caças suecos Gripen respondeu a uma necessidade urgente das Forças Armadas que já ia para quase duas décadas.

A solução, no entanto, abre outro leque de medidas sobre as quais a defesa brasileira terá de se debruçar com igual emergência, com foco especial para uma: a integração de Aeronáutica, Exército e Marinha, especialmente no quesito tecnológico.

A partir de agora, já parcialmente reequipadas, as três corporações terão de sentar à mesma mesa para desenvolver a conversa de diferentes equipamentos, importados de países distintos, cada qual com seus sistemas e realidade particulares. Em síntese, o desafio é conseguir fazer a comunicação entre os submarinos nucleares, os caças e os helicópteros, para que eles, de fato, cumpram toda a funcionalidade — só para citar o que foi comprado nos últimos anos pelo governo brasileiro.

Até aqui, o histórico de atuação de Aeronáutica, Exército e Marinha sempre pecou na comunicação e na cooperação. São três forças, mas de atuações quase distintas, separadas. O professor de relações internacionais Gunther Rudzit, das Faculdades Rio Branco, reforça que, em operações de fronteira, por exemplo, espera-se que pilotos da Força Aérea e tropas do Exército consigam manter um diálogo comum, integrado, o que hoje não é tarefa fácil, mas extremamente necessária. Para tanto, tudo indica a necessidade urgente de desenvolvimento de sistemas de comunicação exclusivos das Forças Armadas e por elas compartilhados. Durante audiência pública promovida no Senado em novembro, o chefe do Centro de Comunicações e Guerra Eletrônica do Exército, general Antonino dos Santos Guerra, chegou a exemplificar a confusão que impera no setor.

“Fazemos operações de fronteira que reúnem até 42 agências do Estado. É uma confusão. Ninguém fala com ninguém, não há interoperabilidade e o resultado é aquém do potencial.” Melhor resumo da situação, impossível.

Esse avanço tecnológico no setor de comunicação é quase tão importante quantos as outras aquisições no horizonte. Enquanto a Aeronáutica pleiteia a compra de aviões de transporte desenvolvidos pela Embraer, a Marinha precisa substituir navios de superfície por fadiga do material atual. A corporação ainda sonha com a organização de uma segunda esquadra para proteção mais efetiva da Região Norte e da Foz do Amazonas.

Nada disso resultará em uma política real de segurança nacional, no entanto, sem a tal integração tecnológica e um sistema próprio de comunicação.

Hoje, esse sistema demanda a necessidade de um satélite exclusivo para as Forças Armadas, inclusive com faixa de frequência para transmissão de dados restrita à Defesa. O problema disso reside no caráter nacional desses equipamentos. Para Rudzit, é vital que tudo seja de fabricação brasileira, ou o mais próximo disso. Somente com essa característica, o Brasil estaria livre de interferências como a da National Security Agency (NSA) evidenciada pelo caso Snowden. O desenvolvimento de um aparato genuinamente tupiniquim, no entanto, talvez demore um tempo que o país não pode esperar.

Pontos críticos

Durante os últimos eventos considerados de alto risco para a segurança pública nacional no ano passado, especificamente a Copa das Confederações e as manifestações de junho, o Exército montou operação sobre uma banda específica, na faixa de 700MHz — destinada, em sua maioria, para tecnologias de celulares 4G. Em caráter de teste, foi utilizado um sistema piloto desenvolvido pela Motorola Solutions, orçado em US$ 2 milhões.

A aplicação efetiva, no entanto, esbarra exatamente no fato de a empresa ser situada nos Estados Unidos. Pelos mesmos argumentos apresentados neste espaço pelo professor Gunther Rudzit, especialistas veem com reserva a contratação. O Exército, no entanto, tem se posicionado favoravelmente à aquisição definitiva do sistema e afirma que ele funcionou bem quando demandado. Faltaria, no entanto, convencer o Palácio do Planalto de que ele é a prova de interferências externas. A empresa garante que sim, mas especialistas mantém reservas.

O fato é que, para o Brasil poder chamar de política de segurança as atuais ações isoladas do setor, é preciso ir além de caças e de submarinos. Na Copa do Mundo, provavelmente, funcionaremos na base do jeitinho. Em sistemas versão teste.

Fonte: Correio Braziliense

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