Médicos da Marinha dos EUA se unem à missão de navio-hospital brasileiro no rio Amazonas

A 1º Tenente da Marinha do Brasil Lívia Laura (à esq.) e o Capitão de Fragata da Marinha dos EUA Edmund Milder (à dir.) examinam uma jovem paciente durante a visita à clínica médica Heraclio Emiliano Moda, em Axinim, Brasil - FOTO: 2º Sargento da Marinha dos EUA Byron C. Linder

Por 2º Sargento da Marinha dos EUA Byron C. Linder & Relações Públicas das Forças Navais do Comando Sul dos EUA

As Marinhas dos Estados Unidos e do Brasil realizaram a Missão Fluvial Brasileira para prestar assistência de saúde à população local e criar interoperabilidade médica em apoio às missões conjuntas humanitárias e de auxílio em desastres.

No dia 4 de fevereiro de 2019, o Navio de Assistência Hospitalar (NAsH) Carlos Chagas  (U 19), classe Oswaldo Cruz da Marinha do Brasil, partiu de Manaus, Brasil. Quatro médicos da Marinha dos EUA embarcaram para trabalhar junto com seus homólogos da Marinha do Brasil e levar assistência médica a diversos povoados pequenos espalhados pelas margens do rio Amazonas durante um mês.



Nos primeiros 20 minutos após a partida, a demarcação entre o porto de Manaus e o rio Amazonas ficou clara. Nas águas azuis e profundas, fragmentos escuros começaram a emergir – sedimentos dos densos bancos de areia e da constante erosão das margens dos rios. Pedaços flutuantes de grama verde brilhante apareceram, destacando-se entre os ricos minerais levados constantemente pela correnteza.

Troncos grossos e sem casca flutuavam, cuja madeira polida mostrava uma cor escura lustrada pela água. Quando o sol começou a se pôr atrás das nuvens, o litoral se tornou visível apenas na periferia, com a água marrom impondo o seu lugar como o elemento visual dominante.

Desde outubro de 2018, o Capitão-Tenente da Marinha do Brasil Diego Abreu serve no Chagas como oficial de convés e armamentos. Essa é a sua quarta missão no rio Amazonas e navegar nesse rio é um desafio em constante mutação. O CT Abreu conta com o apoio de uma equipe de 10 marinheiros da Marinha do Brasil que utilizam tanto instrumentação como vigilância direta para garantir uma navegação segura.

“O principal desafio é a área restrita na qual navegamos. Às vezes um outro navio se aproxima e não temos a profundidade necessária para desviar dele”, disse o CT Abreu. “Desta vez estamos navegando rio acima, contra a corrente. Temos que permanecer bem perto da floresta, o que às vezes é perigoso, mas devemos manter uma velocidade que nos permita chegar aos pontos de paradas da nossa missão.”

Uma rápida olhada para fora do navio mostra como a manobra é restrita: os brasileiros que vivem às margens do rio podem ser vistos acenando para o pessoal no convés do navio. Segundo o CT Abreu, esse tipo de disciplina constante de navegação requer um treinamento especializado.

“Normalmente, nosso principal treinamento de navegação é em mar aberto. Ao chegar a Manaus, é quando somos treinados para a navegação fluvial”, explicou.

O Capitão de Corveta da Marinha dos EUA John Roman examina um jovem paciente durante uma visita à clínica médica Heraclio Emiliano Moda, em Axinim, Brasil, no dia 6 de fevereiro de 2019. (Foto: 2º Sargento da Marinha dos EUA Byron C. Linder)

A equipe do CT Abreu se alterna entre o posto de pilotagem, que está dois andares acima do nível principal, e as áreas de proa e popa do navio. “Na ponte de comando, minha função é trabalhar com os departamentos de operações e engenharia, mas minha equipe está totalmente focada nas operações de convés”, disse.

A tripulação utiliza cartas de navegação; no entanto, as informações ali contidas podem se tornar desatualizadas em algumas horas, o que o CT Abreu identificou como outro desafio. “Nós fazemos anotações e as repassamos às outras embarcações que navegarão nessa área. Elas podem utilizar essas anotações para uma navegação mais segura”, afirmou.

Destroços naturais, tais como troncos e pedras no rio, são um risco constante e, à noite, um grande refletor operado da ponte de comando ilumina constantemente o caminho do Chagas. Sem navegação por sonar, um ecobatímetro é o único instrumento de que o Chagas dispõe para medir a profundidade, e essa profundidade muda rapidamente, dependendo do local onde o navio esteja no Amazonas.

Apesar dos desafios de navegação que enfrenta, o Chagas foi construído para ser um navio-hospital fluvial. Essa é uma característica única da frota de cinco navios da Marinha do Brasil designada para tal.

O Capitão-Tenente John Sullivan e o Capitão de Corveta Robert Lennon, dois dos quatro médicos da Marinha dos EUA a bordo do NAsH Carlos Chagas – U 19, conversam com o CMG da Marinha do Brasil Hilcelio Freitas (Foto: 2º Sargento Byron C. Linder)

O Capitão de Mar e Guerra da Marinha do Brasil Hilcelio Freitas, comandante do Chagas, assumiu o cargo apenas uma semana antes da partida de Manaus. No entanto, o navio já lhe é familiar desde 2010, quando serviu como engenheiro chefe do Chagas, cargo que ocupou durante dois anos.

“Eu aprendi muitas coisas importantes sobre o navio quando estive aqui. Fiquei muito feliz quando recebi a notícia de que voltaria a Manaus para ser o capitão”, declarou. “Essa é uma missão muito importante para ajudar as pessoas nessas comunidades. Essa gente precisa muito desse tipo de ajuda.”

O CMG Freitas destacou que o convés de voo do Chagas é um dos seus principais recursos, podendo ser usado para evacuações médicas de emergência. “A capacidade de traslado nos permite trabalhar com muita rapidez”, disse. “Podemos oferecer tudo o que os demais navios-hospitais oferecem, e mais.”

O Capitão de Corveta da Marinha dos EUA Robert Lennon, chefe da equipe americana, concordou com o CMG Freitas até certo ponto. Tendo servido em missões consecutivas no Brasil a bordo de outro navio-hospital em 2018, ele prontamente elogiou as capacidades do Chagas.

“[O CMG Freitas] está sendo modesto. Aqui há um melhor equipamento – um novo aparelho de raios-X e um novo aparelho de ultrassom. Esse é um verdadeiro navio-hospital”, disse. “É realmente bom ver isso, e a integração com a Marinha do Brasil é excelente. É importantíssimo podermos, ambos, trabalhar juntos e prestar essa assistência humanitária.”

Capitão de Corveta da Marinha dos EUA Robert Lennon atendendo uma criança (Foto: 2º Sargento da Marinha dos EUA Byron C. Linder)

O histórico brasileiro de levar assistência às comunidades ao longo do rio Amazonas remonta a 70 anos atrás, em 1949, ressaltou o 1º Tenente da Marinha do Brasil Gilvan Martins, oficial médico geral, que está fazendo o seu estágio no navio. Naquela época, a Marinha do Brasil estava mapeando o rio Amazonas e os marinheiros visitantes perceberam que as pessoas que moravam nas comunidades ribeirinhas necessitavam de ajuda. O primeiro navio-hospital classe Oswaldo Cruz só foi construído 35 anos depois, portanto, essas embarcações utilizavam o que estava disponível a bordo.

“As tripulações desses navios separavam comida para dar para essas pessoas e as convidavam a bordo para tomar um banho e receber alguns cuidados básicos. Tivemos a oportunidade de fazer algo diferente. Eu acho que o Brasil é um dos primeiros países a prestar esse tipo de assistência hospitalar”, declarou. “Essa missão é muito desafiadora e algumas áreas têm um acesso muito difícil, de uma maneira geral. Existem muitas doenças infecciosas nessas comunidades e é muito bom fazer parte desse trabalho assistencial.”

A Missão Fluvial Brasileira é um esforço conjunto entre as Forças Navais do Comando Sul dos EUA (NAVSO, em inglês) e o Nono Distrito Naval da Marinha do Brasil, cuja missão é prestar assistência à população local, criar interoperabilidade médica em apoio às missões conjuntas de assistência humanitária e ajuda em desastres, bem como fazer um intercâmbio de conhecimentos médicos. Essa é a terceira missão deste tipo e serve como uma plataforma para expandir o treinamento da Marinha dos EUA em doenças tropicais, que em última análise combina o treinamento no Instituto de Medicina Tropical em Manaus, seguido de uma missão médica conjunta na bacia do rio Amazonas.

“Esse tipo de missões só trazem benefícios a todos”, disse o Capitão de Mar e Guerra da Marinha dos EUA William Scouten, cirurgião da frota da NAVSO. “Nós [a Marinha dos EUA] vivenciamos práticas médicas e cenários que talvez não vejamos aqui nos Estados Unidos e, ao mesmo tempo, mais jovens médicos brasileiros têm a oportunidade de ser treinados por oficiais médicos seniores e usar equipamentos aos quais, de outro modo, talvez não tivessem acesso.”

FONTE: Diálogo Américas



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