Setor de defesa muda para sobreviver

Por André Ramalho

O anúncio de contingenciamento de R$ 6 bilhões no orçamento da Defesa, às vésperas da feira de negócios mais importante do setor no país, realizada na semana passada no Rio, não chega a surpreender o mercado. Diante da restrição de capacidade de investimentos do governo, a indústria brasileira de bens e serviços da base de defesa e segurança teve de buscar mercados alternativos para seus produtos nos últimos anos e promete intensificar o movimento de diversificação, seja no concorrido mercado internacional, seja a partir do desbravamento de novos nichos no mercado interno.

Na semana passada, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) anunciou nova linha de crédito específica para países interessados em comprar da indústria brasileira de defesa e segurança, que responde por 3,7% do Produto Interno Bruto (PIB). O mercado aguarda maiores detalhes sobre as condições da linha, mas recebeu com bons olhos a notícia do governo.

“[A linha do BNDES] Vem num momento oportuno. Temos hoje 100% de nosso faturamento vindo do mercado nacional, mas a expectativa para os próximos anos é ter 20% de nossas receitas oriundas de exportações. Temos parceiros na Espanha, Alemanha e Áustria. Nosso sistema de bloqueio de drones está em validação para clientes desses países e temos propostas já colocadas”, afirma Luiz Carlos Teixeira, presidente da empresa de tecnologia IACIT, que fechou 2016 com receitas líquidas de R$ 14 milhões, alta de 40% ante 2015. Teixeira conta que outra aposta de diversificação da empresa tem sido o fornecimento para o setor privado, na área civil. Ele destaca que a empresa desenvolveu um sistema de telemetria de contêineres, de olho na expansão prevista para o setor de logística de portos.

Outro caso semelhante é o da Avionics, fornecedora de equipamentos e sistemas para aviões. A empresa busca intensificar sua atuação no mercado internacional e quer explorar também a venda de veículos aéreos não tripulados para aplicação civil, no monitoramento de áreas agrícolas e dutos. “Muitas vezes o setor de defesa do Brasil não absorve toda a tecnologia desenvolvida no país. Na Avionics estamos trabalhando nesse movimento [de diversificação]. Foi uma necessidade que apareceu”, comenta Henrique Gomes, presidente da IAI do Brasil, empresa israelense que detém 40% de participação na Avionics.

O Brasil não é uma potência exportadora, mas a internacionalização das empresas brasileiras é um movimento em expansão. Segundo dados da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), o setor de Defesa e Segurança exportou R$ 4,7 bilhões em 2015 (os números de 2016 não estão consolidados), aumento de 23% sobre 2014. Presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Materiais de Defesa e Segurança (ABIMDE), Frederico Aguiar, conta que as exportações brasileiras tendem a manter sua trajetória de crescimento, ainda que a participação do Brasil ainda represente uma parcela muito pequena do mercado mundial, de US$ 1,5 trilhão. Um dos principais caminhos das empresas nacionais, segundo ele, é buscar mercados onde as principais potências, como os EUA e a Europa, têm maior dificuldade de penetração, por questões geopolíticas.

“Como Brasil é um pais amistoso e que guarda boas relações com a maioria dos países, segundo a égide da ONU [Organização das Nações Unidas], para os brasileiros as vezes é mais fácil entrar em mercados mais difíceis do que para empresas americanas e europeias. Norte da África e Ásia são mercados que levam mais tempo para obter permissões de importação de produtores americanos e europeus”, disse.

A principal potência brasileira no setor é a Embraer Defesa e Segurança. A companhia, candidata natural à nova linha de incentivo à exportação do BNDES, para a venda do cargueiro KC390, abriga uma série de pequenas e médias empresas subsidiárias que traçaram como meta exportar bens e serviços para clientes da holding. A Atech, que fornece produtos e serviços na área de comando, é um caso de internacionalização em curso. Em 2016, a empresa implementou, na Índia, a primeira fase do sistema de gestão de fluxo de tráfego aéreo do país asiático. O plano é intensificar o processo.

FONTE: Valor Econômico

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