Defesa Nacional no Brasil ganha cada vez mais espaço no mundo acadêmico

Ministro da Educação, José Mendonça Bezerra Filho, e o General-de-Exército Décio Luís Schons, comandante da Escola Superior de Guerra (primeira fila, da dir. para a esq.)

Por Nelza Oliveira

O Ministério da Educação e Cultura (MEC) do Brasil, por meio do Conselho Nacional de Educação (CNE), incluiu a defesa nacional no rol das ciências estudadas no Brasil nos níveis de mestrado e doutorado. Já existem algumas instituições civis e militares que oferecem cursos stricto sensu (em sentido específico) relacionados ao tema, mas não havia antes essa normativa. O que acontece na prática é que com a formalização o tema ganha mais notoriedade no mundo acadêmico e facilita a aprovação pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), vinculada ao MEC, de mais cursos nessa área, seja a pedido de instituições civis ou militares.

A solicitação foi feita pelo Exército Brasileiro ao CNE e o parecer favorável foi publicado no Diário Oficial da União em 15 de maio. Para os militares, a iniciativa vai estimular um universo de profissionais mais bem qualificados a concorrer futuramente a uma carreira de defesa. Já os alunos interessados no tema contarão com mais acesso a estudos estratégicos sobre agendas de maior impacto à soberania nacional.

“O parecer tratou de uma necessidade normativa. É uma formalização de reconhecimento de que a área pode, portanto, ser capaz de propor em torno dela um esforço de financiamento e de formação no âmbito de mestrados e doutorados. Com a área criada e admitida, a CAPES tem agora condições de identificar em seu cadastro e inserir a defesa como área de conhecimento e permite que instituições possam propor esse curso”, explicou o conselheiro Luiz Roberto Liza Curi, presidente do CNE e relator do parecer. “Acho que qualifica a formação de recursos humanos numa área com diversas subáreas que devam se comunicar fortemente com a questão da defesa em outros âmbitos que não só a defesa de invasão”, acrescentou.

Mais participação civil

Aproveitando o momento, a Escola Superior de Guerra (ESG) vai propor à CAPES, em setembro, que avalie que seu curso piloto de especialização lato sensu (em sentido amplo) de Segurança Internacional e Defesa possa se tornar o primeiro curso stricto sensu da instituição. Criada em 1949, a ESG é um instituto integrante do Ministério da Defesa do Brasil para estudo e pesquisa de política, estratégia e defesa, aberta a civis e militares.

“Desde que foi criada juntando militares das três forças e civis, a ESG já tinha essa visão de pluralidade. A seleção é por meio de edital público e por convites para instituições, civis e de empresa”, explicou o Contra-Almirante da Marinha do Brasil Antonio Ruy de Almeida Silva, assessor de pós-graduação da Coordenadoria Geral de Pós-Graduação da ESG. “Quando se fala em defesa, a instituição que mais divulga o tema no meio civil, diria até acadêmico e de defesa, é a ESG. Nossa intenção agora é termos mestrado e doutorado stricto sensu no âmbito da CAPES”, continuou.

O Contra-Almirante da Marinha do Brasil Antonio Ruy de Almeida Silva é o assessor de pós-graduação da Coordenadoria Geral de Pós-Graduação da ESG. (Foto: Nelza Oliveira)

O C Alte Ruy contou que o estudo na área de defesa avançou muito a partir do lançamento pelo Ministério da Defesa, em 2005, do Programa de Apoio ao Ensino e à Pesquisa Científica e Tecnológica em Defesa Nacional (Pró-Defesa), que busca fomentar a cooperação entre instituições de ensino superior civis e militares para implementação de projetos de produção de pesquisas científico-tecnológicas, além do desenvolvimento de cursos de pós-graduação stricto sensu na área. Para que instituições públicas e privadas brasileiras possam pleitear financiamento do Pró-Defesa, elas devem ter em seus programas de pós-graduação stricto sensu reconhecidos pelo MEC com áreas de concentração ou linhas de pesquisa em defesa nacional, ou apresentar projeto viável de implantação dessas linhas de pesquisa.

Entre alguns dos projetos contemplados pelo programa estão os da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, “Desenvolvimento de materiais compósitos para uso em veículos militares”, e da Universidade Federal do Rio de Janeiro, “Desenvolvimento de ferramentas biotecnológicas para detecção rápida de agentes patogênicos potencialmente utilizados como arma biológica”. O C Alte Ruy citou ainda a criação, também em 2005, da Associação Brasileira de Estudos de Defesa, sociedade acadêmica e civil, reunindo professores e pesquisadores voltados para os estudos ligados à defesa nacional e à segurança internacional.

“Depois disso, vieram vários programas. Na verdade, esse reconhecimento da defesa agora é uma continuidade do processo, uma consolidação. Não acaba aqui não. São etapas de um processo que vai avançando cada vez mais: uma abertura maior, um entendimento maior, trazer os civis para conhecerem os programas de defesa, participarem das políticas de defesa. Quanto mais civis e o legislativo participarem dos programas de defesa, mais credibilidade, mais legitimidade e recursos virão para a área”, afirmou o C Alte Ruy.

Intercâmbio acadêmico

Para Sergio Felicori, especialista em políticas públicas e gestão governamental do Instituto Brasileiro de Estudos em Defesa Pandiá Calógeras (IBED), órgão de pesquisa e assessoramento do Ministério da Defesa, a universidade pode contribuir para a defesa na produção de tecnologia, diálogo com a elite intelectual da sociedade, preservação da história e produção de conhecimento aplicado à estratégia e à segurança internacional.

“Consideramos um grande passo para o reconhecimento da área de defesa como campo científico de estudos. Isso abre as portas para a implementação de linhas de pesquisa específicas em defesa em universidades e outras instituições de ensino superior”, lembrou.

O IBED promove desde o ano passado o Programa de Serviço Voluntário (PSV), que oferece a estudantes e pesquisadores a oportunidade de maior contato com o tema da defesa, além de subsídios ao trabalho acadêmico universitário na área, tanto nos cursos de graduação como de pós-graduação. O IBED indica tutores que proporcionam o acesso a bancos de dados e redes de contatos, fornecendo orientação técnico-científica e a intermediação com outras instituições e pesquisadores.

Em retorno, o Ministério da Defesa poderá utilizar o conteúdo das pesquisas realizadas em favor das atividades da defesa nacional. Para 2017, as linhas de pesquisas oferecidas foram Amazônia, Amazônia Azul, Cultura de Defesa, Economia de Defesa, Entorno Estratégico, Operações de Paz e Defesa e Parlamento.

“Os temas desenvolvidos por esses projetos relacionam-se com alguns dos temas prioritários do Ministério da Defesa como entorno estratégico (América do Sul e Atlântico Sul, incluindo a costa ocidental africana) e a economia de defesa”, explicou Carlos Timo Brito, especialista em políticas públicas e gestão governamental do Ministério da Defesa e coordenador do PSV do IBED. “Além da contribuição dos projetos de pesquisa para o aperfeiçoamento das atividades e das políticas desenvolvidas por esta pasta, espera-se que haja uma aproximação da gestão governamental com a academia”, completou.

FONTE: Diálogo Américas

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